Autor: Ed Rodrigues
Por muito tempo busquei poemas e palavras para defini-la.
Li o que escritores dotados de enorme talento suspiraram e escreveram, mas foi numa lágrima que ela realmente se revelou a mim..
Ah! Saudade...
Dos tempos de criança, cuja preocupação maior era não apresentar aos pais um boletim com notas vermelhas e adivinhar qual seria o presente no final do ano.
Saudade da inocência perdida, que me fazia ver o mundo com outros olhos, mais bonito e quase perfeito.
Saudade do riso fácil e de quando o nojo tornou-se algo prazeroso com o primeiro beijo.
Ah! O primeiro amor...
Como diz o ditado: “a gente nunca esquece”.
Não a pessoa em si, mas aquele sentimento bom que poucas vezes sentimos na vida.
Saudade de quando fui apresentado ao queijo com goiabada, da construção de carrinhos e ônibus com latas de óleo, caixas de pasta de dente. Mais prazer havia em construi-los que brincar. A construção da imaginação tornava-se a maior diversão.
Ah! Saudade do céu colorido de pipas, arraias e da nascente brotando o desejo de voar como astronauta.
Saudade da primeira bicicleta, das frequentes idas ao circo, das danças em volta da fogueira junina, do álbum de figurinhas, no qual aprendi que o Brasil era apenas um bairro de uma grande cidade que lembrava meu esporte preferido, o futebol.
Saudade das macarronadas de domingo e a mesa repleta de familiares e amigos.
Amigos...
Ah! Amigos...
Como viveríamos sem eles?
Se fecho os olhos e limpo o cérebro com os cotonetes da concentração, facilmente ouço seu latido e sinto seu cheiro...
Seus olhos desconfiados procurando os meus, mas logo se entregando por completo num feliz abano de rabo. Saudade de nossas corridas pelo sítio e das caçadas a tatus e borboletas.
Saudade dos tempos que não voltam e que tantos calos marcaram no coração.
Depois de Bodinho, outros amigos vieram, como o Paulinho, a Rosana, mas foi com os cachorros que aprendi o que é ser fiel e verdadeiro amigo.
Quando adolescente, morando numa vila de pescadores, fui adotado por Napoleão e Rodolfo, dois cachorros que não eram bem tratados por seus donos. Na época era barman em um restaurante e Napoleão me acompanhava todos os dias ao trabalho.
Não podia entrar, por isso, esperava-me do lado de fora até altas horas da madrugada para levar-me em segurança para casa.
Amanhecíamos e dormíamos juntos. Íamos à praia, à festas e aos poucos Napoleão ensinou-me o que é preocupar-se com alguém.
Hoje, sentindo saudade de um simples cão, dói minha alma ao lembrar de um animal sentado na linha do horizonte.
Napoleão sabia que chegara o dia de minha partida. As malas prontas e o rumo traçado com direção à jardineira que dava fuga à vila, eram o prenúncio que nossa separação aconteceria.
Rodolfo e Napoleão por quilômetros correram atrás da jadineira, num misto de esperança que eu não os estaria abandonando.
Eu ali, sentado, espectador daquela cruel maratona, pensei em voltar. Deixar de lado meus planos e ficar ao lado deles. Levá-los não era possível, pois eu não tinha destino certo.
Todos os passageiros gritavam para que eles voltassem. Inútil pedido.
Com um nó na garganta, não fui capaz de deixar marcado em seus tímpanos minha últimas palavras.
Correram até não suportarem mais. Rodolfo tropeçou e não teve forças para se levantar.
Napoleão, mais forte, ainda continou, mas exausto, sentou no alto de uma duna, vendo num perdido olhar seu amigo lhe trair.
Naquela manhã crianças choraram e adultos voltaram a ser crianças.
Ah! Saudade...
Neste momento, as mesmas lágrimas ainda caem ao lembrar de meus amigos fiéis, porém não mais me preocupo em definir saudade, pois ela, por si só, se definiu a mim.
Nossa, Ed, teu texto me fez transbordar.
ResponderExcluirTô com a cara inchada de chorar.
Você conhece a música "Diana" do Toninho Horta? ele fez pra cachorrinha dele. É linda. Teu texto também.
Valeu!
Mando um beijo e galera daqui de casa também: Iup, Kilt e Adelaide (todos pastores alemães)
Oi Ana!
ResponderExcluirObrigado por sua visita e pelas lágrimas...
Tenha certeza que no cálice salgado das emoções elas foram muito bem depositadas...
Vejo que você também aprendeu e aprende com os pastores, mesmo que eles falem outra língua, como o alemão rsrs...
Vou escutar a música. Acho que não conheço. Valeu pela indicação!
Forte abraço!